DESAFIOS DO FAZER PEDAGÓGICO (II)

DESAFIOS DO FAZER PEDAGÓGICO (II)

Pensamento crítico: como estimulá-lo na escola

Vale começar com um truísmo: pensamento crítico é pensar, atividade

humana que a escola deve valorizar, superando a mera memorização e a

repetição de conteúdos que pouco tenham a ver com a realidade de

adolescentes e jovens que frequentam a escola. Até mesmo os processos

seletivos para ingresso em universidades demandam, cada vez mais, o

trabalho de reflexão e de análise mais refinadas na identificação de

respostas “certas” nos grandes exames vestibulares. Colocam-se questões

que exigem mais do que o acúmulo de informações para serem

respondidas. Cobra-se capacidade crítica de pensar. Esta exigência vale

para temas relevantes em cada campo de conhecimento e para questões

cuja abordagem atualizada já as coloca na perspectiva da

transdisciplinaridade, exigindo esta a superação das fronteiras tradicionais

entre campos de conhecimento.

A reflexão sobre os meios de estimular o pensamento crítico na escola

pode ser conduzida a partir de dois pontos de vista, o de quem está ali

para ensinar – professor e professora – e o de quem está ali para aprender

– aluno e aluna. De um lado, colocam-se os desafios de organizar planos

de ensino e de conceber formas eficientes de motivação para a

aprendizagem de conteúdos complexos. Do outro lado, estão pessoas que

vão ser introduzidas no mundo do conhecimento já consolidado sobre

fenômenos naturais e humanos, conhecimento que não pode mais ser

encarado como simples e de fácil aquisição, dada a complexidade que o

caracteriza neste estágio de desenvolvimento da humanidade. E não se

esqueça que o processo educacional, na atualidade, é ele mesmo objeto

de polêmicas sobre o que deve (ou não deve) ser ensinado na escola. Em

tal contexto, promover e estimular o pensamento crítico é um desafio e

tanto!

Em uma primeira abordagem, vejamos como tal desafio se apresenta para

cada lado. Na perspectiva do planejamento das atividades escolares, cabe

aos mestres, no universo do conhecimento consolidado, identificar

conceitos, teorias e teses que estão sendo objeto de revisão no plano de

pesquisas científicas. Assim procedendo, mostram, em primeiro lugar, que

o processo de produção de conhecimento sobre fenômenos naturais e

humanos é dinâmico e que a inovação no campo das ciências resulta do

constante exercício de um olhar crítico aplicado sobre o já sabido, que

não é aceito como verdade definitiva e incontestável. Mostram, em

segundo lugar, que o avanço do conhecimento sobre fenômenos naturais

e humanos tem consequências no mundo real, impondo revisões nos

modos de conviver e de fazer as coisas. Em tal contexto, cabe aos mestres

identificar as polêmicas que movimentam a esfera pública, que opõem

opiniões sobre a solução que deve prevalecer para problemas que afetam

coletividades inteiras e, em muitos casos, a humanidade inteira. São

questões complexas, cuja compreensão completa e abrangente, implica,

cada vez mais, a adoção de abordagens transdisciplinares. Nessa

perspectiva, cabe à escola estimular a realização de atividades que

integrem as várias disciplinas na busca de uma visão sistêmica, holística

mesmo, de polêmicas relevantes, que empolgam debates no plano

público. Trata-se de estimular a compreensão de todos os ângulos de uma

questão complexa, que demande posicionamento sobre o que fazer para

solucionar um problema real que afete a convivência coletiva, referido a

fenômeno natural ou humano. Exemplos: o que fazer para impedir o

avanço do aquecimento do planeta e os impactos dramáticos das

mudanças climáticas (vamos ter guerras para acesso a recursos hídricos?);

como evitar epidemias globais, que causam mortes e sequelas duradouras

em sobreviventes (vamos ter novas pandemias?); como diminuir a

pobreza global (o mundo rico vai ser invadido pelos pobres da terra?);

como evitar o uso da inteligência artificial para finalidades criminosas (o

mundo humano vai ser dominado por máquinas?).

Do seu lado, alunos e alunas, que são adolescentes e jovens vivendo em

um mundo conectado pela internet e movimentado pelas redes sociais,

apropriam-se do conhecimento seletivamente, visualizando problemas e

polêmicas nem sempre percebidos e tratados nas salas de aula por seus

mestres. Estes se orientam por planos de ensino concebidos na

perspectiva do ano letivo e não do tempo emocional de adolescentes e

jovens, o tempo de hoje. Em tal contexto, cabe à escola a tarefa de

promover o levantamento e caracterização das questões que seus alunos

e alunas identificam como polêmicas aos seus olhos, envolvendo opiniões

e posicionamentos diversos, às vezes antagônicos. Não se espera que as

questões que perturbam os adolescentes e jovens caibam naturalmente

nos planos de ensino. Mas, cabe à escola propiciar as condições para que

essas questões, devidamente colocadas como temas para debate

transdisciplinar no mundo de hoje em fórum para isto a ser criado como

parte do planejamento anual, por exemplo, o Projeto Meu Mundo – Um

Mundo Melhor. Trata-se de promover espaços de esclarecimento e troca

de ideias, nos quais as diferentes disciplinas contribuam para a visão

completa e abrangente das questões que preocupam e perturbam alunos

e alunas. Assim procedendo, a escola cumpre o papel de oferecer os

elementos para a fundamentação das opiniões que venham a se

contrapor em arrazoados bem informados para facilitar posicionamentos.

É essencial que o projeto seja conduzido com equilíbrio e firmeza por

mestres que se disponham a assumir mais um papel no plano educacional:

além de ensinar uma disciplina, o de mentores do processo de

amadurecimento intelectual e crítico de alunos e alunas, assim

contribuindo para preparar adolescentes e jovens para enfrentarem os

desafios colocados para a humanidade no atual estágio de

desenvolvimento da civilização. São desafios cuja solução demanda, cada

vez mais, em razão de sua complexidade, o exercício permanente do

pensamento crítico.

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