O menu de investimentos nunca esteve tão farto no Brasil. Como andam as suas degustações?
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O menu de investimentos nunca esteve tão farto no Brasil. Como andam as suas degustações?

Você não sente nem vê
Mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo
Que uma nova mudança em breve vai acontecer
E o que há algum tempo era jovem novo
Hoje é antigo, e precisamos todos rejuvenescer

Sempre que eu escuto Belchior encontro alguma referência ao mundo dos investimentos — implicitamente, é claro. Também pode ser o caso de eu estar consumindo “El Bigodon” em excesso, ou viver pensando em investimentos... Pode ser...

Ou, vai ver, o poeta do Ceará, dentre tantos mistérios, tinha uma bela carteira de ativos e estava nos passando mensagens cifradas para nos ajudar a nos tornar melhores investidores. Vai ver…

O fato é que me peguei pensando em quantas mudanças estão acontecendo no mercado de capitais: ações de tecnologia, investimento no exterior, criptomoedas, cannabis, China, carros elétricos, carbono, ESG, “carne de planta”, SPAC, viagens espaciais, Índia, robótica…

É tanta coisa nova para aprender e investir, que não sei nem por onde começar. Pra falar a verdade, nem dá tempo — a não ser que aumentem o dia para 30 horas, mas ainda não vi nenhum projeto neste sentido, infelizmente. 

Por conta disso, a solução que tenho adotado é inverter um pouco essa ordem: investir e depois aprender. Pra ser sincero, venho fazendo isso há algum tempo e o resultado tem sido bem interessante. Mas, se parar para pensar, é natural que seja assim, afinal, por mais que a teoria seja importante, investir é uma “ciência” que se aprende na prática.

Há dez anos, quando ainda era um moleque, decidi investir em ações; como não sabia nada, dei uma fuçada na Internet e “meti mão” em dois ou três livros; entendi mais ou menos, mas ainda tinha um monte de dúvidas e não estava seguro. Foi aí que decidi “começar pequeno”: abri uma conta em uma corretora, separei R$ 200,00, e comprei ações de três empresas, que por sinal, me lembro até hoje: Embraer, Cielo e Marcopolo — o critério de seleção? Vai saber! Uni duni tê talvez...

Sinto lhe decepcionar, mas não transformei esses 200 paus em R$ 1 milhão e fui morar na praia. Eu não fiquei rico, mas, logo na largada, aprendi um bocado de coisas: que só dava para investir por meio de uma corretora, o que era o home broker, o que era o lote-padrão e o mercado fracionário (já que só tinha grana para “brincar no parquinho”), como executar uma ordem e o que era uma nota de corretagem etc. Depois de alguns meses recebi alguns centavos de dividendo e JCP, uma das ações fez um desdobramento...

É claro que eu continuei estudando, mas viver na prática estes eventos acelerou à quinta potência o meu aprendizado. E o melhor de tudo é que eu não fiquei nem um pouco aflito com o meu dinheiro, porque investi muito pouco para começar. À medida que fui aprendendo mais, fui aumentando minha exposição — gostei tanto dessa brincadeira que decidi trabalhar com investimentos, e estou nessa cachaça até hoje.

O fato é que fui adotando essa mesma estratégia ao longo da minha jornada. Fundos, títulos de renda fixa de bancos menores, derivativos…; fui aprendendo, estudando e metendo a mão na massa, não necessariamente nesta ordem.

Mas a verdade é que o mercado brasileiro, até quatro ou cinco anos atrás, não havia mudado muito. A partir daí, iniciou-se uma verdadeira revolução, quase um “cinquenta anos em cinco” à la Kubitschek. Nos últimos dois anos, então (e principalmente no último ano), foi uma verdadeira loucura, uma novidade atrás da outra, numa velocidade de tirar o fôlego.

Diante de um menu cada vez mais farto, mais uma vez recorri a minha velha estratégia: mão na massa + pouca grana + estudo. Fiz a mesma coisa com as criptomoedas há quatro anos: coloquei uma grana baixíssima e fui descobrindo como o mercado funciona devagarzinho. Ainda sei pouco, mas tenho melhorado — e considerando a quantidade de dinheiro que tenho aplicado, a montanha-russa da variação de preços não tira meu sono; se as criptomoedas sumirem do mapa amanhã, dormirei como uma pedra.

Tenho repetido a dose com investimentos no exterior, empresas de tecnologia, ativos relacionados ao mercado de cannabis, investimentos na China, “carne de planta”,, economia compartilhada, FIPs, ETFs, empresas de games e crowdfunding. Pretendo fazer o mesmo com urânio, carbono, investimentos na Índia, carros elétricos…

Ah, e se você pensa que eu tenho um caminhão de dinheiro, não é bem por aí — pelo menos não por enquanto, eu espero. A melhor parte dessa “nova mudança que já está acontecendo” é que os pequenos investidores estão ganhando cada vez mais opções para investir: há um monte de corretoras e exchanges, no Brasil e no exterior, e um sem-número de ativos e fundos diferentes.

Mas não me interprete mal, por favor. Eu não estou lhe incentivando a sair por aí colocando seu dinheiro em qualquer novidade que aparece, sem nenhuma consulta prévia, sem nenhuma experiência. Não é assim que a banda toca. Se você fizer isso, é muito provável que perca seu dinheiro suado, além de se tornar uma presa fácil para aproveitadores.

Vamos por partes; se você já manja dos paranauê, os próximos cinco parágrafos podem soar repetitivos, me perdoe. Começando do começo, você precisa ter uma base, isto é, precisa saber o bê-á-bá das finanças: ter um orçamento e gastar menos do que ganha — sem isso, você não será um investidor. Vencida esta etapa, precisará formar uma reserva de emergência, juntar uma grana numa aplicação líquida e de baixo risco, para usar em momentos de dor de barriga, a chamada reserva de emergência.

Depois de fazer isso tudo, receberá o seu crachá de investidor. O passo seguinte é estabelecer metas de curto, médio e longo prazos, e ir enchendo essas caixinhas com aplicações cujo risco seja coerente com estes prazos (horizontes de investimento, no linguajar do mercado).

Aí sim, você poderá adotar uma estratégia, digamos, mais experimentalista. Mas é importante lembrar que os valores envolvidos “nessa degustação” precisam ser pequenos, pois erros serão inevitáveis. Além disso, é preciso estudar continuamente, pois a experiência é fundamental, mas o mercado financeiro tem muitas regras e nuances — algumas muito chatas, diga-se de passagem —, e se você quiser se dar bem, precisará conhecê-las.

No começo, quando ainda estiver “verde”, sugiro que destine o grosso das suas aplicações para fundos de investimento, por contarem com profissionais qualificados para investir o seu dinheiro — ah, mas só para eu não esquecer: até para aplicar em um fundo você terá que estudar e pesquisar um pouco, para entender a classe de ativos, o risco envolvido, os custos etc.

Depois que as suas experimentações se transformarem em aprendizado e estiver mais seguro e motivado, poderá aumentar a grana aplicada em “sua própria gestão”. Falo motivado, porque tem muita gente que não tem saco para o mercado financeiro e prefere terceirizar os seus investimentos. Se for o seu caso, zero problema; apenas se assegure de escolher os “cuidadores” do seu dinheiro com zelo e cuidado. 

Quando chegar até aqui, já terá aprendido coisa pra caramba, e se for curioso e continuar estudando, estará voando, tenha certeza. Além disso, o que é muito importante, seu capital será maior, assim como os seus rendimentos, o que fará com que o seu poder de poupança aumente, lhe dando condições e segurança para experimentar muito mais novidades, formando um ciclo virtuoso.

A vantagem dessa estratégia é que ela lhe permite sair na frente em muitos casos, e no mercado financeiro, mais que em qualquer outra área, “quem chega primeiro, bebe água limpa” — imagine se você tivesse investido R$ 100,00 na Amazon há 20 anos, ou no Bitcoin há 10 anos?

Mas cuidado para não se empolgar quando ver uma dessas experimentações pipocando. Se você não sabe como operar e não conhece bem os riscos, não exagere na dose, porque a chance de se dar mal é enorme. Pense só se você tivesse investido R$ 100,00 no Bitcoin há 10 anos e, depois de vê-lo decolar, decidisse colocar todo o seu dinheiro nele; o que aconteceria se, logo depois disso, este ativo caísse 40%, e o que é pior, sem você entender o porquê?

A mensagem aqui é muito clara: se você não consegue se controlar e se empolga facilmente, esta estratégia não é para você, infelizmente. A diversificação e gestão de riscos compõem o “Santo Graal” dos investimentos. Então, só aumente as suas posições em um ativo se tiver noção do que está fazendo e se puder suportar o risco envolvido.

Nunca se submeta ao risco de “morte” financeira, pois além de dolorosa, pode ser muito difícil retornar do mundo dos mortos. Lembre-se que algo que caiu 50%, precisa subir 100% para recuperar o prejuízo; se cair 100%, bom, não precisa muita matemática: aí fudeu…

Finalmente, para se dar bem utilizando essa estratégia, busque assimetrias positivas, isto é, posicione seus ativos de tal modo que possa ganhar muito se as coisas derem certo e perder pouco se as coisas derem errado.

Aqui, o Barbell Strategy, de Nassim Taleb, cai como uma luva: coloque muito dinheiro em pouco risco (coisas que entende, no nosso contexto) e pouco dinheiro em muito risco (coisas que não entende). E para continuar com Taleb (afinal, a cópia é forma mais honesta de homenagem), sempre aposte centavos para ganhar reais, e nunca aposte reais para ganhar centavos — entendeu agora o que é assimetria positiva?

Por último, e não menos importante, se quiser se dar bem experimentando novos ativos, precisará “abrir a cabeça” e separar os seus investimentos dos seus ideais e (pre)conceitos. O dinheiro não dá a mínima para opiniões políticas, valores pessoais, crenças ou achismos… Mas isso é papo para outra hora.

Experimente com moderação! Bon appétit”!


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